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Os sonhos ou o sistema

Numa sociedade em que se incute e se apregoa, cada vez mais, a importância da Formação Académica, não só dos nossos jovens em geral mas, sobretudo dos nossos Jovens Atletas é notória a dificuldade que muitos deles se deparam no seu dia-a-dia universitário. Frequentar o Ensino Superior em Portugal implica, muitas vezes, o abandono da carreira desportista ou, em contrapartida, uma dificuldade acrescida incutida pelo Sistema na conciliação do Desporto de Alto Rendimento com o Ensino Superior.


Como é possível que muitos dos nossos Jovens Atletas se vejam obrigados a abdicar da sua atividade desportiva em prol da sua formação académica?

Maria Vieira num jogo de hóquei em patins. Créditos: Sport Lisboa e Benfica


O meu nome é Maria Vieira, tenho 25 anos e sou Médica. Além de Médica sou guarda-redes de hóquei em patins do Sport Lisboa e Benfica e da Seleção Nacional Portuguesa. Muitas são pessoas que me abordam e questionam-me relativamente às barreiras com que me deparei ao longo da minha formação académica (6 anos do curso de Medicina + 1 ano de internato geral, até ao momento), ficando grande parte delas surpreendidas quando lhes explico que as maiores barreiras com que me deparei e com as quais tive que lidar e ultrapassar foram as adjacentes à Mentalidade Humana.


Desde episódios e comentários como: “A menina tem de escolher entre o hóquei e a medicina”, “Ninguém conclui um curso de medicina e constrói uma carreira médica a praticar desporto ao mesmo tempo”, “Se a menina continuar a praticar desporto nunca vai sair da faculdade” até mesmo falta de abertura para alteração de datas de avaliações de componentes teóricas e práticas, falta de apoio na integração da estudante-atleta no regresso às aulas após uma competição desportiva, o débil contacto entre docentes e aluna-atleta enquanto me encontrava ausente da instituição de ensino por motivos desportivos, vivenciados por mim na primeira pessoa, marcaram o meu caminho e fazem-me agora colocar em retrospetiva todo o processo para chegar até aqui. Torna-se, de facto, relevante e pertinente para o futuro do desporto e da sociedade portuguesa refletirmos sobre esta temática de modo a que possamos olhar, à posteriori, para um futuro em que todos aqueles que ambicionem levar a cargo uma carreira desportiva, em conjunto com uma carreira universitária, se sintam suportados e apoiados pelo sistema e por todos os que os rodeiam.


O que deveria pensar uma simples jovem de 18 anos, praticante de hóquei em patins desde os 4 anos de idade e com o sonho de ser médica, perante todas estas questões impostas ao longo do seu percurso académico por parte de determinados docentes?


Será que era a jovem que sonhava demasiado alto ou é o sistema que não tinha “espaço” para a ambição e felicidade de uma simples jovem atleta de dezoito anos?


Algures o ano passado enquanto dava uma palestra surgiu a seguinte pergunta da plateia: “Se a Maria pudesse mudar alguma coisa no seu caminho, o que teria sido?”, à qual a minha resposta foi tão simples e espontânea como: “Nada. Não mudaria nada”.


O caminho que vivemos e que traçamos ao longo da nossa vida é aquilo que nos torna aquilo que somos hoje.


E eu, hoje, posso dizer que sim é possível concluir com sucesso um curso de medicina e ao mesmo tempo ser atleta de alto rendimento.


Posto isto, está na hora de apoiarmos os nossos jovens e de lhes mostrarmos que o segredo da vida está em fazermos aquilo que nos apaixona!


São cada vez mais os jovens atletas de alta competição que fazem questão de investir no seu percurso académico, algo que é de louvar e de apoiar, ao invés de os fazermos sentir desapoiados, julgados, desprotegidos.


“Nem o céu é o limite para quem sonha e sabe o valor dos seus sonhos !”

Maria Vieira

Médica

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