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Em Portugal a Segurança Social é para (quase) todos

Existe em Portugal, desde o pós-25 de abril, um Sistema de Segurança Social, assente no pressuposto da existência de um DIREITO UNIVERSAL que, como conhecemos, se não assiste a todos, não pode ser chamado de universal.


Foi com a Constituição da República Portuguesa de 1976, que o direito à segurança social veio a ser explicitamente consagrado, no seu artigo 63º “Segurança Social e Solidariedade”. E, apesar deste artigo ter sido já objeto de três alterações, a sua essência manteve-se, sendo a sua redação atual a seguinte:


1. Todos têm direito à segurança social.


2. Incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado, com a participação das associações sindicais, de outras organizações representativas dos trabalhadores e de associações representativas dos demais beneficiários.


3. O sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho.


4. Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de atividade em que tiver sido prestado.


5. O Estado apoia e fiscaliza, nos termos da lei, a atividade e o funcionamento das instituições particulares de solidariedade social e de outras de reconhecido interesse público sem carácter lucrativo, com vista à prossecução de objetivos de solidariedade social consignados, nomeadamente, neste artigo, na alínea b) do n.º 2 do artigo 67.º, no artigo 69.º, na alínea e) do n.º 1 do artigo 70.º e nos artigos 71.º e 72.º

De facto, a Lei diz que todos os cidadãos têm direito à segurança social, mas não é assim, como recentemente vimos nas redes sociais com a morte de uma jovem advogada, recém mamã e com uma doença oncológica, que trabalhava enquanto estava internada numa cama de hospital.


E porquê? Porque os advogados, como os trabalhadores independentes, não só não tem direito à comummente chamada “baixa” como ainda têm de pagar as suas contribuições à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, vulgo CPAS. Este foi um caso, mas como este existem milhares. E se nada for feito, se nenhumas medidas forem tomadas no sentido de corrigir a injustiça, o nosso país vai continuar a caminhar ao vento, mas infelizmente a duas velocidades.


A respeito destes profissionais liberais, a nova bastonária da Ordem dos Advogados, Fernanda de Almeida Pinheiro, parece querer romper com este estado de coisas ao defender propostas com um cariz mais social. Ela quer alterar as regras de contribuição para a caixa de previdência por não existir justiça contributiva, já que as contribuições não são feitas na proporção dos rendimentos.

Vejamos: as sociedades de advogados têm trabalhadores, mas não pagam qualquer contribuição de previdência pela prestação serviços de que usufruem – é assim na maioria dos casos – ao contrário do que acontece em outras profissões. Nessa medida os profissionais liberais que estão nas sociedades de advogados são trabalhadores por conta de outrem só que sem direitos, sem previdência, sem assistência social.


Ora, se a Segurança Social é o corolário e garantia da democracia formal, ela não pode nem deve defraudar os cidadãos quando dela mais necessitam. Sobretudo se o seu fim é garantir um padrão mínimo de vida e uma igualdade social e jurídica, bem como contribuir para a manutenção da ordem, paz e da coesão social.


A Segurança Social para poder ser encarada como uma realização política tem de conseguir concretizar.

A Segurança Social para poder ser encarada como uma realização política tem de conseguir concretizar plenamente os direitos de cidadania de todos (universal) tal como nos ensinam alguns dos mais ilustres constitucionalistas portugueses, Gomes Canotilho e Jorge Miranda. A contrapartida para a existência de uma democracia política é a existência de uma democracia económica e social, assente no direito à segurança social. Porque ninguém vive sem acesso à saúde, aos apoios ou às prestações sociais quando mais delas carecem. Ninguém vive sem isso, mas morre-se no nosso país por falta disso isso!


A Lei prevê que todos os cidadãos tenham direito à segurança social, mas alguns (muitos) ficam de fora. Porquê?

Porque existem sistemas paralelos e não se integram os regimes contributivos no sentido de redimir as discrepâncias.

E como é que o Estado tem desempenhado o seu papel, se não apoia e não fiscaliza e não é justo?


Existe um limiar mínimo pelo que todos os cidadãos devem lutar. E esse, digo eu, é o combate da modernidade que é conseguir garantir para todos o princípio da dignidade da pessoa humana e a consagração dos direitos sociais.


Viver em democracia em pleno século XXI e assistir a estas discriminações não pode ser uma realidade com a qual nos conformemos. Temos de lutar por um Sistema de Segurança Social que efetivamente chegue a todos e seja justo.

Marta Vieira

Docente Universitária



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