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Entrevista a Liliana Reis

Liliana Reis é professora do departamento de Sociologia da Universidade da Beira Interior e da Universidade Lusófona, comentadora de assuntos internacionais e cabeça de lista da Aliança Democrática pelo Distrito de Castelo Branco.


Como especialista em Relações Internacionais, como vê o Mundo em 2024, em termos de conflitualidade? A tensão crescente na Ásia e o conflito iminente entre a China e os Estados Unidos, a respeito de Taiwan, poderão somar-se-á aos conflitos já existentes no Médio Oriente e na Europa?

Em 2024, o Mundo enfrenta vários desafios. Alguns que poderão agravar-se e que não tiveram início este ano e outros que poderão precipitar-se. Recentemente os EUA deram um passo crucial para desbloquear a ajuda à Ucrânia no valor de 95 mil milhões de dólares (o qual inclui também, Israel e Taiwan) e que está aparece num momento crucial para a Ucrânia. 


Relativamente ao conflito Israel-Hamas, a situação é igualmente difícil. Em primeiro lugar, porque há de facto o risco de escalada de conflito para alguns estados da região. O Irão tem tentado desestabilizar a região, não apenas através do Hamas, mas também dos Houthis no Iémen, com ataques permanentes a navios no Mar Vermelho, e através da ação terrorista do Hezbollah no sul do Líbano.


No que concerne a Taiwan, e depois das eleições que fizeram antever o pior, parece-nos que nem a China tem, neste momento, vontade de uma confrontação direta com Taiwan. Apesar de não ser excluída devido ao princípio de “uma só China” e a pretensão de reunificação defendida por Xi Jiping, o que é certo é que o presidente Chinês sabe que uma invasão de Taiwan significará uma resposta dos EUA e uma ameaça muito séria à economia mundial, já muito frágil. O que observamos atualmente é a união de algumas médias/grandes potências, como a Rússia, a China, o Irão, o Brasil, África do Sul que contestam a potência hegemónica ou dominante.


Nas palavras de Organski, que nos apresentou a teoria da transição de poder, a guerra é a mais provável, de maior duração e de maior magnitude, quando um desafiante ou vários desafiantes ao poder dominante entram em igualdade aproximada com o Estado dominante e estão insatisfeitos com o sistema existente. Ora, é precisamente a situação que vivemos. Por isso, a perceção da fragilidade norte-americana ou europeia é tão perigosa. 


Pode representar a transição do poder e o fim da ordem liberal internacional. 


As eleições norte-americanas vão ocorrer em Novembro. Quais são as verdadeiras hipóteses de Donald Trump regressar à Casa Branca? Isso será bom ou mau para o sistema internacional?

Em primeiro lugar, há uma enorme probabilidade dos Republicanos elegerem, nas primárias que estão a decorrer, Donald Trump como o candidato presidencial, e o seu regresso à Casa Branca também, uma possibilidade. Não me parece que o Partido Democrata tenha com Joe Biden, o melhor candidato para enfrentar Donald Trump. 



Se a vitória de Donald Trump será boa ou má para o sistema internacional não conseguimos antecipar. Mas sabemos, já, que será negativa para os EUA e para a democracia norte-americana. Repare que Donald Trump tem sido um dos principais veiculadores de desinformação e Fake News relativamente a várias matérias, nomeadamente em relação à Ciência. Por exemplo, a instituição académica, a Alliance for Science (Aliança ara a Ciência), da Universidade Cornell, depois de analisar vários artigos, revelou que uma elevada percentagem continha informações falsas relacionadas com a pandemia Covid-19 e que as menções a Trump se situavam nos 37%”.


A nível mundial Donald Trump será muito mais imprevisível, não apenas para os Aliados (os quais já ameaçou com a saída da NATO), mas também para os inimigos e para os competidores estratégicos, o que poderá constituir uma elemento acrescido de dissuasão.


Durante os governos de António Costa não pareceu existir uma estratégica clara da nossa diplomacia, a não ser pedir mais dinheiro a Bruxelas. Na sua opinião, como deve posicionar-se Portugal na sua política externa?

Portugal têm 4 Eixos ao nível da Política Externa que devem ser assegurados e desenvolvidos: a Lusofonia, o europeísmo, o atlanticismo, não apenas no aprofundamento das relações institucionais no quadro das respetivas Organizações Internacionais, CPLP, UE e NATO, mas também ao nível bilateral com estados destes três espaços geopolíticos. O quarto elemento que considero fundamental ao nível da Política Externa é a nossa Diáspora. Os portugueses que se encontram espalhados pelo mundo são os nossos primeiros embaixadores e, por isso, é muito importante que o estado português reconheça este legado. 


A Aliança Democrática teve oportunidade de integrar no seu programa eleitoral os principais contributos do Conselho Estratégico Nacional com esta “pasta” e responsabilidade, a qual tive oportunidade de integrar e deixamos claro que “num mundo interdependente e em mudança, o posicionamento externo de Portugal é determinante não apenas para a soberania do Estado e para o alinhamento internacional, mas também tem consequências na vida de todos e de cada um de nós. Na nossa segurança, no nosso bem-estar e na nossa liberdade. É, pois, necessária, e urgente, uma visão clara, integrada e estratégica para Portugal nas diversas dimensões da Política Externa, dos Assuntos Europeus, das Comunidades Portuguesas e da Diáspora. 


As nossas representações diplomáticas são alvo de muitas críticas. É necessário também uma reforma no Ministério dos Negócios Estrangeiros?

As principais criticas às nossas representações diplomáticas inserem-se na falta de meios, não na qualidade dos nossos Diplomatas. Na verdade, a qualidade dos Diplomatas portugueses é reconhecida e enaltecida em todo o Mundo. Considero, pois, que deve ser alocado uma fatia maior do quadro orçamental ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, para que os nossos Diplomatas possam desempenhar as suas funções com outro tipo de meios e, naturalmente, rever as prioridades da nossa rede consular.


Na sua opinião, como deve ser gerida a política de imigração em Portugal e na Europa?

Na minha opinião e também subscrita pelo programa Eleitoral da AD, a política de imigração deve ser regulada, humanista e orientada para as necessidades do mercado de trabalho, flexível na sua execução e que permita a entrada legal de imigrantes em território nacional.  Vencer a crise demográfica também passa por políticas de integração de imigrantes, e de um olhar atento às necessidades dos que chegam, sem esquecer aqueles que já cá vivem, os Portugueses. 


Uma política de imigração regulada deve simultaneamente acolher, estar atento para cuidar, e investir nas qualificações e no capital humano dos imigrantes acelerando o seu conhecimento cultural, linguístico, o seu capital humano, e assim a sua efetiva integração na comunidade. 


O multiculturalismo das nossas sociedades não deve, porém, alienar direitos fundamentais, que são constitucionalmente garantidos. Nem em Portugal, nem na Europa. 


O relativismo cultural não deverá sobrepor-se ao universalismo humanista que tem caracterizado as nossas sociedades, nem justificar atos atentatórios da igualdade de género ou dos direitos das crianças.

O etnocentrismo de que muitas vezes temos sido acusados na Europa não poderá turvar a visão que temos do Ser Humano. Na verdade, foram estes valores tributários do iluminismo e da matriz judaico-cristã que permitiram alicerçar os quadros axiológicos e normativos que garantem, hoje, proteção aos cidadãos.


O que fez aceitar o desafio de ser candidata pela AD pelo Circulo Eleitoral de Castelo Branco? Se for eleita, o que trará de novo ao Parlamento?

O primeiro motivo foi o amor que tenho à minha terra e às minhas gentes. Como sabe, sou natural do Fundão e escolhi o Fundão para residir. Em segundo lugar, porque acredito que Portugal precisa de uma mudança quer a nível político, mas também a nível económico. E apenas a AD pode assumir essa mudança e unir Portugal e os Portugueses em torno de um projeto político que devolva a confiança dos cidadãos às instituições políticas mas, também, àqueles que desempenham cargos políticos.


Por fim, a radicalização que se observa da sociedade portuguesa, alimentada pela polarização do debate público e político exige que todos os Democratas  digam "Presente", seja para dar a cara, como o fiz, seja para contrariarem essa tendência iniciada PS com o acordo parlamentar com o PCP e o Bloco de Esquerda. 


Temos observado que a crispação do debate público atingiu patamares que poderão comprometer a nossa democracia e alienar direitos fundamentais, como o direito à igualdade (pelo ataque a minorias) ou o direito à propriedade privada ("pela habitação, não lhes dês descanso), ambos inscritos na CRP. Por fim, não me demitirei, nunca, da minha responsabilidade e dever cívico de defender o que considero ser o melhor para a minha região e o meu país.


Se for eleita, posso asseverar que pretendo garantir a coesão territorial, que o território como um todo não é esquecido. Sobretudo, que as especificidades das pessoas, das empresas, ou das instituições (por exemplo as de ensino superior, a UBI ou IPCB ) deste território serão respeitadas e ouvidas no procedimento legislativo. Naturalmente, que estou a estudar propostas concretas que pretendo apresentar à coligação que represento, e que irão ao encontro do Programa de Governo, mas não irão ouvir da minha parte qualquer medida demagógica sem qualquer exequibilidade num programa de governo.


Como fundanense, quais são os principais desafios da interioridade?

O nosso país é muito pequeno. Repare que falar de interioridade já nem deveria fazer sentido nos dias de hoje. Ainda assim, o Fundão e os territórios de baixa densidade enfrentam vários desafios. Desde logo o desafio demográfico. Depois, o desafio da competitividade, não apenas da redução fiscal na matriz de desenvolvimento local, regional e nacional, mas na aposta da tecnologia e transferência de conhecimento das universidades.


Um programa para a Competitividade tem de forçar dinâmicas efetivas de aposta na tecnologia, seja ao nível da conceção de novas ideias, seja ao nível da acomodação de novas empresas. E Isso apenas, poderá acontecer com uma redução significativa dos impostos. E temos, também, o desafio da inclusão social: a nossa região e o nosso país terão de saber mais do que integrar, incluir de forma positiva os seus cidadãos 


Depois o desafio da excelência territorial. As cidades e vilas do interior têm uma oportunidade única de potenciar um novo paradigma de cidades pequenas e médias voltadas para a qualidade, a criatividade, a inovação e a sustentabilidade ambiental. Verdadeiros centros de modernidade participativa, que façam esquecer a dinâmica asfixiante das “grandes cidades”.


Um programa territorial para a Modernidade é vital para dar conteúdo estratégico à ocupação do nosso território e à nova vontade de apostar no interior. 


Por fim, o Desafio da Modernidade Cultural, através da recuperação da base cultural alicerçada no potencial histórico das nossas aldeias.


O Concelho do Fundão é considerado como um caso de sucesso na atracão de novos casais, a maioria altamente qualificados. A que se deve este sucesso?

O sucesso do Fundão deve-se sobretudo à visão holística e humanista do Presidente da Câmara, Paulo Fernandes, que tem sabido aproveitar todas as oportunidades de captação de Investimento e, simultaneamente, de pessoas. 


No entanto a autarquia do Fundão enfrenta também desafios. A população sente que algumas das decisões são, apenas, dirigidas para o exterior e para aqueles que escolhem o Fundão para investir ou viver. É, por isso, crucial que nem a Autarquia nem o Governo se esqueçam daqueles que nasceram cá e por cá querem continuar. Não se esqueçam de todos aqueles que tiveram que sair e um dia esperam regressar. Por isso, referia que o desafio da Inclusão social deve acomodar todos, sem exceção.


Como professora universitária como vê a luta dos professores e o estado da Educação em Portugal?

Como professora universitária o regime de progressão na carreira é por concurso e, por isso, diverge da luta dos professores que temos assistido. Ainda assim, também enfrentamos o problema da precariedade. Relativamente à luta dos professores considero-a justa e necessária. Por isso, defendo a reposição do tempo de serviço, conforme o programa da AD, assim como a dedução em sede de IRS das despesas de alojamento, a desburocratização do trabalho dos professores e medidas de incentivo à fixação de docentes.  


Fernando Santos

Politólogo

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